sábado, março 10, 2012

O óculos. A tarde. Os companheiros.

Não olhei nos seus olhos no dia em que nos vimos da primeira vez, nem me detive no seu nariz tão evidente, no teu olhar sério ou na tua cara de CDF. Não, eu estava numa escola nova me sentindo o patinho feio, e quando eu não estou insegura acabo me escondendo na minha carranca, na minha audácia e na porra louquice. A gente não se olhou e foi amor a primeira vista não, ainda bem. Seu olhar para mim não dizia nada. Mas passaram se os anos e eu dividi meus textos com você, alguns segredos e finalmente a gente era amigo de se reconhecer um no olhar do outro. Mas não a gente não estava apaixonado, ainda bem. Você me ensinava física, química e matemática e eu não te ensinava nada. Lia como louca o que não era matéria da aula, discutia no corredor a conjuntura da educação no país, no estado, na nossa escola e atrapalhava a tua aula que por acaso era a minha também, porém eu cabulava quase sempre as aulas de exatas. Você me acompanhava ouvindo minhas ideias, compartilhando pensamentos e quando percebi você fazia parte do grêmio, do movimento político da escola e estávamos em sintonia, finalmente além de amigos tínhamos alguma coisa em comum para fazer, mas não a gente não estava apaixonado, ainda bem.
Tenho a sorte de saber o dia exato que você se apaixonou por mim, em um final de tarde na reunião que havíamos marcado para formar um grupo para passar o legado do que havíamos conquistado todos juntos no grêmio, já não estudávamos na mesma sala e nos conhecíamos há mais de dois anos, eu entrei usando óculos pela primeira vez na frente dos amigos, um óculos de grau de armação grossa e com formato engraçado, a minha cara. Sentei no birô e peguei meus apontamentos ia falar pra os novatos e incentiva-los a levar o projeto do grêmio adiante e um tempo depois você me contou que olhou para mim ali sentada, falando e balançou a cabeça como se estivesse zonzo sem acreditar que me via diferente. Seriam os óculos?? Acho que não, realmente ali eu já era outra mesmo, bem diferente da menina que você havia conhecido lá atrás, tantos namoros, tantas leituras, festas, amigos e lutas me transformaram, e sim meu querido amigo você naquele dia se apaixonou por mim a primeira vista, ainda bem. E eu? Bem, para variar eu estava noutra. E fiquei nesse outro por um tempo ainda, porque eu precisava e você sabia disso. Uns meses depois, você me contou tenso, ansioso que a amizade era diferente, que você havia se apaixonado e eu? Estava pronta para vê-lo diferente e passei a ver. Assim fácil. Acho que a gente foi construindo esse novo olhar. sabe há quanto tempo isso aconteceu? quase sete anos. Onde estamos hoje? no nosso apertamento um no quarto estudando e o outro no PC escrevendo. Casados, apaixonados, cúmplices, grandes amigos ainda, ainda bem.
Tanta água passou por esse rio. Foi tanta água e a gente já teve que dar boas braçadas juntos para não se separar, para virar adulto e não perder o freio. E aqui estamos juntos, muitos anos depois daquela tarde e dos meus óculos que nem existem mais. Não importa quanto tempo já passou, mas quanto ainda há de vir e é claro que a gente continue existindo e que ainda sejamos grandes companheiros.

Um comentário:

Diego Couto disse...

Às vezes fico na dúvida se esse ou aquele texto se refere a mim, às vezes até sei que se refere mesmo, mas prefiro deixar no anonimato pra dar à função literária uma maior evidência, mas esse não... Esse é quase biográfico. E é verdade. A tarde, os óculos, os companheiros. Tem dias que você me pergunta se sou feliz nessa nossa vida. Acho até uma afronta, mas sei por quê vc pergunta. E vc tb sabe pq considero uma afronta. E o melhor de tudo sabe o que é? Esse é só o começo...