domingo, fevereiro 26, 2012

Das coisas que eu não entendo.

Creio que tudo possui várias perspectivas, tudo. E por isso me dou ao luxo de pensar em tudo um milhão de vezes ou até não conseguir extrair mais nada da tal vivência em questão. É óbvio que tem coisas que eu já dediquei horas e que ainda não entendi, e talvez nunca entenderei e não me importa isso, o que importa mesmo é ter pensando, dedicado horas da minha vida a questionar, entender e construir o que é opinião minha e não consenso coletivo.
Vendo tv, acabei numa entrevista de João Carlos Martins, pianista e hoje regente, que desde sempre só olhar pra ele em qualquer lugar enche meus olhos de lágrimas, gera um choro engasgado uma dor na espinha, porque só quem já viveu pelo menos um dia na vida com a mão atrofiada consegue ter a dimensão do que é aquilo, principalmente para um pianista por exemplo. Sei que não sou como escritora nem de muito longe o pianista que ele foi, porém, talvez eu já tenha chorado as mesmas lágrimas. Lágrimas de quem conversa com as mãos e tem que reaprender a falar com o resto do corpo, a dor de não poder mais ser a única coisa que você tinha certeza que era, não mais poder fazer o que te move, e o pior de tudo porque visívelmente e existem provas médicas que você não pode mais. Não há um não querer, é um não poder.
É quando a vida te nega uma esmola, você precisa daquilo pra viver, pelo menos é assim pra você - é o seu alimento, a sua essência vital - mas a vida diz olhando nos teus olhos sem piedade, perdoe. Vivi algumas vezes esse momento, um cara de branco olhando nos meus olhos dizendo você tem que parar, não era definitivo (ainda), porém não deixava de ser cruel por não ser.
E sobre não poder escrever, levantar um copo para beber água, tomar banho e trocar de roupa eu já pensei horas a fio, já chorei um mar de lágrimas e já consegui contaminar algumas coisas aqui dentro com um pesar, talvez, irreparável. Você não sai de uma lesão, de um imobilização, você não engole um não como esse fácil. Você tem que enlutar, pensar e sofrer horrores questionar a vida e acabar pensando na morte, como coisa boa, como coisa ruim. Ruminar a sentença do não poder, eu transcritora braille há tanto tempo, que conheço tantas pessoas sentenciadas, que nunca poderam ver nada na vida, ou nunca mais poderam ver nada para o resto da vida. Eu, que poderia ser tão mais calejada, mais forte, choro o meu não poder e as minhas dores como se não tivesse experiência nenhuma, porque realmente não tenho. Depois de muito pensar entendi que existe a minha dor, e principalmente a minha perspectiva da dor, e quem me enxerga possui uma visão diferente sobre a minha dor. E essa dor de perder algo individual não pode ser encarrada como uma vivência coletiva. Os meus amigos, meu marido e o resto da família tem visões diferentes da minha dor e a minha dor causa neles dores que eu desconheço. Mas aquele tal João Carlos Martins ainda me comove, e eu tenho que entender porque me comove tanto assim.
Amo arte e pessoas, amo a humanidade que existe nas duas. Uma das minhas certezas na vida. Amo as palavras e suas eternizações profundamente, amo as palavras que dançam na minha cabeça 24 horas por dia. Eu sou palavra, me apresento as pessoas através delas, me exponho através delas, me componho através delas e sinceramente, não vivo sem elas. E gosto do poder de ser regente das minhas palavras, de possuí-las nas pontas dos meus dedos, as palavras estão aqui nas minhas mãos, o problema são as minhas mãos, que não são de boa qualidade eu diria, tentando amenizar o tom do papo, são as dores cotidianas que as palavras me causam e o que escrever já interfiriu na minha vida para ruim. Mesmo que o que escrever me deu de bom na vida sobresaia eu não posso deixar de perceber o óbvio que me é demostrado todos os dias, quase em doses homeopáticas (as vezes não) que as palavras vão ter que encontrar um novo jeito de sair de dentro de mim, porque por algum motivo caprichoso as mãos um dia não mais poderão regê-las, assim como um dia João Carlos Martins deixou de fazer música atráves das suas mãos nos pianos, eu reles eu que como já disse não sou de escritora nem de muito longe o pianista que ele foi, um dia - espero que ainda distante - quando não mais poderei escrever palavras num papel, num computador ou nas paredes da minha casa e tudo for passodo não tão distante, deverei me lembrar que o que me mantém confiante é que elas nunca poderão sair da minha cabeça e isso me conforta mesmo que meu corpo inteiro esteja atrofiado eu ainda serei palavra em essência, porque no mais profundo de mim é só isso que existe.

terça-feira, fevereiro 21, 2012

QUERO FAZER COCÔ NA CASA DO PEDRINHO!

Seria bom poder cometer meus erros, dar meus chiliques e testar minhas novas atitudes na vida de alguém, no corpo de alguém, se existisse na vida a possibilidade de fazer merda na casa do Pedrinho. Ando cansada de testar a minha capacidade de lidar com dores emocionais no meu próprio corpo. Exausta. Ando de um jeito que um apertãozinho qualquer e eu me desfaço em lágrimas de dores emocionais, físicas, que eu não sei lidar sem remédios e pessoas por perto.
Não acredito que deus só da a cruz que a gente pode carregar, a merda que a gente pode por para fora e lá vai. Não acredito em deus e sua incrível misericórdia. Queria acreditar que existe essa tal casa do Pedrinho onde cocô não fede e é tudo limpinho, onde há a tal mãe do pedrinho que é solicita e gentil como deveriam ser todas as mães e abre a porta sorridente pra gente cagar lá, porque cagar na casa (vida) da gente anda difícil. Quero encontrar esse lugar onde despejar merda, vivências ruins e cheias de dores que eu carrego aqui dentro, seja aceitável. Quero sair da casa do Pedrinho feliz, sentindo o cheirinho bom de casa limpa fora do banheiro por mim tão desejado, quero me sentir acolhida e ando tão afetada emocionalmente que a casa do Pedrinho pra mim já é de bom tamanho.
Colocar pra fora os meus medos guardados, as minhas dores, essas responsabilidades que carrego que não são minhas, os meus lutos, o que eu não entendo, o que eu não aceito mesmo entendendo. Eu tenho um mundo pra descarregar na casa do Pedrinho, resta saber onde é esse lugar e se a mãe dele vai abrir a porta pra mim.

domingo, fevereiro 05, 2012

Banho quente por favor!

Adoraria sentar num canto do quarto, abraçar os joelhos e chorar aquele choro que é que nem aquele catarro de pneumonia que a gente tem desde criança que tá lá envelhecendo no pulmão e sempre volta com gripe forte. Pois bem, quero chorar esse choro-catarro. Quero sentar lá e só sair quanto alguma coisa fizer sentido, porém é domingo a noite, e amanhã sete da matina eu tenho que trabalhar mesmo que não haja sentido algum.
Sempre tomo banho de luz apagada, mania mesmo, sempre sendo dia ou não, gosto de estar sozinha no escuro e no banheiro, de preferência com o chuveiro ligado no máximo bem frio quando a vida tá boa, bem quente quanto eu quero muito um abraço. Cheguei em casa agora louca por um banho e fui direto pro banheiro, sem roupa e com a toalha na mão desliguei a luz, acomodei a toalha e entrei no box e fiquei na dúvida entre água fria ou quente, entende? Entre felicidade e tristeza, entre vontade de abraço e vontade de dancinha ridícula com canto desafinado.
Porque ando pensado tanto que nem sei mais se está sendo bom ou ruim, ando lendo tanto que nem sei mais se isso me eleva ou se me expõe a minha pequenez, nem sei mais se estou chegando em algum lugar ou se nunca estive tão perdida. Esperei por 5 minutos que o chuveiro me soprasse a escolha, devaneando pensei: mas hoje foi um dia não muito bom eu estive disponível para pessoas o dia inteiro o único momento realmente meu hoje foi um sorvete no fim da tarde e esse banho e eu estou tão cansada dessa minha disponibilidade eterna. Água quente por favor, bem forte e bem quente.

quinta-feira, fevereiro 02, 2012

Lendo e devorando a Leila Diniz depois de uma crise

Fechei os olhos e as mãos de cansaço, depois de conversa longa. Abri os olhos segundos depois, apontei o indicador da mão esquerda como sempre fiz, repetindo 'é assim aqui que eu sou, é assim que eu sinto', mas não esperava que não conseguiria mais abrir a mão direita naquele fim de tarde, naquela noite, no hospital, depois da injeção, da tipoia, depois de um fim de semana inteiro eu simplesmente não conseguia abrir a mão direita. Chorei gritando, tremendo, babando, gemendo encolhida até acordar o vizinho, até esquecer porque estava chorando. Dor de alma. Tenho sempre vontade de responder isso pra médica quando ela pergunta: hoje você tem dor de quê? Não digo, vai ela me interna.
Fui num outro médico porque a minha querida e compreensiva médica estava viajando, e ganhei 8 dias de gesso, morfina, analgésico, relaxante muscular e o de sempre. Médica querida de volta e o diagnóstico de mais uma crise 3 comprimidos tarja preta por dia, 1 protetor de estômago e continuar o uso do analgésico já que o estômago não anda aceitando anti-inflamatório, então são 5 remédios por dia por enquanto. Só pude mexer mesmo a mão novamente na segunda uma semana depois daquela piscada de olho e do movimento quase involuntário de fechar a mão.
Não soube o que dizer para mim para confortar, não consegui aceitar bem o início da crise ando sonolenta (crise de fibromialgia dá fadiga né?)e cheia de lágrimas espontâneas. Estou com aquele sentimento novamente de não pertencimento, rodeada de amigos e só com os meus pensamentos. Pirei no dia que tirei o gesso, andei pela cidade, almocei comida que eu adoro, comprei o livro que eu estava louca de vontade de ler e pensei pensei pensei pensei até me perder de mim.
Leila Diniz é sobre quem eu estou lendo, foi onde eu me encontrei e onde eu pretendo me perder. Sempre admirei mulheres fortes e sinceras, mas essa me faz chorar só de pensar em tanta alma. E está sendo tão confortante chorar pela alma da Leila e não pela minha dor na alma porque por causa da minha dor eu já chorei demais, pela minha dor não adianta chorar. Deixa que 5 remédios diários tomam conta, acalentam, me calam.
Tendo a Leila eu me tenho. Sei que não é claro isso, porém, essas coisas de identificação não se explicam. Posso abrir a mão agora mesmo que ainda trema e doa onde não dá nem pra explicar onde sente, vi na tv uma senhora com o braço direito também com hematoma, porque ela foi tirada da casa dela em Pinheirinho pelo braço, de uma hora pra outra, ela perdeu a casa, a vida que viveu lá, o amanhã, assim como eu quando fechei e não abri a mão. O hematoma vai se desfazer, a minha mão já abriu, mas e a casa, a vida e o amanhã dela, quem devolve?
Eu não sei se suporto dor de mundo e dor alma juntas, não sei o quão sou forte, ou má, ou boa só sei que agora doí sentir tudo ao mesmo tempo, doí continuar escrevendo porque os dedos ainda estão fracos, doí querer escrever um artigo acadêmico sobre ativismo individual agora que larguei a universidade, doí ler tanto e com tanto prazer e saber que a universidade me tomou isso por um tempo. O que mais que eu deixei passar porque eu não pude ser ativa? Não sei quem eu sou enquanto definição, só sei que isso vai me levar além, foi o Leminski que disse e não é mentira.