quinta-feira, setembro 25, 2014

"Tudo novo de novo, vamos nos jogar no que já caímos..."

Eu observei uma amendoeira em frente ao trabalho por exatos 30 dias, observei-a timidamente se desfazer de uma folhinha aqui outra ali, amarelar inteirinha como se fosse outono, e não era, e dia após dia chorar suas folhas aos montes. Cobrindo o chão de passado, de fim, de história. E eu imitei a árvore. Vivenciei um processo intenso de 'amarelamento' das minhas folhas internas, eu era inteira outono e nostalgia, tão suscetível à brisa fresca, àqueles sentimentos entre viver e morrer. Me desfiz de muitas folhas, tomei consciência de histórias que vivi e nem lembrava mais, as vi vulneráveis à brisa e uma a uma caindo no chão e me expondo.
A amendoeira estava ali se desfazendo de pé, avisando aos transeuntes que algo estava acontecendo com ela, a árvore estava quase sem folhas, quase vazia e era pura intensidade. Ela era inteira a natureza respeitando suas etapas, era vida naquele exato momento que estava nua em pelo com todas as suas folhas no chão. E eu também era. Vivenciei nesses 30 dias de 'desfolhamento' de memórias a intensidade de sentimentos que guardei a sete chaves, que omiti, que neguei, que senti furar a carne. Quis chorar e chorei. Sorri bobo com o canto da boca algumas vezes. E diversas vezes tola chacoalhei a cabeça com o intuito de parar de pensar em alguém e/ou alguma coisa. Ninguém desconfia mas as minhas memórias estão todas exposta no meio de espelhos que refletem as minhas sombras, puro pathos e saudosismo, inquietude e arrependimento, algumas coisas não voltam mais e estar consciente sobre isso em muitos aspectos dói. Os meus transeuntes não desconfiam do meu desfolhamento, eles não percebem porque eu não posso me dar ao luxo de árvore e simplesmente me expor. Por que não? Não está claro ainda, mas nesse aspecto bom mesmo seria ser árvore de canteiro. Bom mesmo seria dispor de tempo para vivenciar os meus processos emocionais lentamente, respeitando suas etapas. O que eu vivenciei nesses 30 dias foi um furacão, nada de brisa fresca, foi um intenso processo nostálgico, uma seleção das memórias que mereciam permanecer e das que não faziam mais sentido. Foi ganhar, reviver uns encontros, sentir velho gosto na boca, cheiros, uns abraços e uns afetos. De igual maneira foi perder, algumas esperanças, expectativas e ilusões. Eu tenho que ser mais árvore e menos gente, tenho que focar no processo da amendoeira, ela perdeu tudo e ficou galhos, caule e folhas secas no chão sem mais nenhuma ligação. Depois de desfolhada ela começou a apresentar uns novos brotos em seus galhos, folhas pequenas começando, a vida e a primavera trazendo um recomeço. A árvore não se importa com as folhas que foram embora, elas simplesmente não fazem mais parte dela, simples assim. Agora ela precisa focar no processo de brotamento do novo, da construção de uma nova copa. Novas folhas, mesmos galhos, a vida não é assim mesmo? Cíclica com folhas caindo e nascendo o tempo todo. De tempos em tempos desfolhando completamente, nos expondo ao que se esconde por trás. Ninguém desconfia mas o que me alegra é saber que as folhas novas tem um quê das antigas, porque eu vi que algumas folhas adubaram o grande caule, algumas folhas simplesmente ficam e não importa a força da brisa ou do furação, elas acham um jeito de permanecer em nós. Que ruim. Que bom. Ainda não me decidi.
A amendoeira superou e já está cheia de folhas novas e eu pretendo conseguir o mesmo.