quinta-feira, março 29, 2012

Porque eu tive...

Não podia mais, não suportava o peso. Era muita gente amontoada nos meus cantos, era muita história boa e ruim, era muito pathos. Tinha hora que eu era uma multidão, eu era meus irmãos, meus amigos, meus amores, meu marido, e acabava não sendo eu. Porque eu tenho essa mania de ser por inteiro, e quando eu me coloco no lugar de alguém eu levo a sério e simplesmente deixo de ser. Porém aprendi no teatro que entre um papel e outro o ator merece um intervalo, eu merecia e fiz.

Pode ser que eu tenho sido abrupta, até posso ter deixado um monte de gente sem explicação, mas é que eu estava sentindo sem controle. Movida por uma necessidade louca e ininterrupta de ser eu. Eu mesma, sem máscaras e pessoas. Sem nada imutável, sem verdade e relações absolutas. E quando eu cheguei lá, quando finalmente me desliguei de todo mundo, era uma noite de um dia da semana que eu não lembro, mas era noite disso eu tenho certeza, peguei uma toalha e fui ao banheiro tomar um banho, desliguei a luz, sentei no chão de chuveiro ligado, água quentinha e fiquei lá em silêncio. Nunca mais tinha estado tão sozinha, tão inteira. Eu estava recomeçando dali. Só existia o de hoje em diante e era quase mágico. Algumas fichas caíram e eu voltava a ser minha, mesmo que dividida em cacos mas era minha. E tudo o que eu fiz se justificava e fazia um sentido lúcido.

As relações necessárias voltam, as impostas também, mas hoje não, só quando eu estiver pronta pra voltar aos palcos. Ainda estou carinhando meu ego, colando pedaços, me curtindo. Um dia quem sabe, eu restabeleça algumas das relações que desfiz esses dias, porém para isso eu preciso ser outra e os relacionados também. Porque eu não mais permitirei invasões e/ou pesos nos meus cantos. E também preciso possuir novamente a vontade (necessidade) honesta destas pessoas, porque eu não tenho. A distância me fez perceber que eu me impunha pessoas (mãe, pai e...) e eu não posso mais, estou vivenciando um momento libertador. Caminhando lagarta. Eu sou bicho, especificamente daquele tipo que se despede dos pais para encontrar seu caminho. Aí está a minha despedida de libertação e (honestamente) sem olhar pra trás nenhuma vez.

quinta-feira, março 15, 2012

Por uma nova causa. Eu mesma.


Não que eu não venha me dedicando a mim nesses últimos anos, mas sinto que não estava fazendo isso certo. E estou feliz demais por reconhecer isso, hoje mais forte e preparada pra essa constatação. Mesmo que eu tenha perdido umas partes de mim nessa jornada me sinto inteira, da maneira exata que eu imaginava que estaria quando chegasse aqui. É fato - disso não tinha dúvidas - eu estaria exatamente assim quando estivesse pronta para dar o primeiro passo para fora do cercadinho. Só não sabia a hora exata que isso ia acontecer mais eu estava pronta. E entendo agora o porque de um monte de coisas. Das minhas vírgulas, nos textos, na vida. Tenho sentido a necessidade de pontos finais. Pontos que realmente me desacelerem. E assim nesse movimento natural venho aprendendo a substituir as minhas vírgulas por pontos, mesmo que não sejam pontos definitivos, porém devem ser bem marcados. Na vida, nos textos.
Porque é para mim que escrevo e ninguém mais. É para entender, absorver das palavras que dançam na minha cabeça o tempo todo, tudo que há em mim e me escapa dos sentidos. É por isso que absorvi essa mania de enfileirar palavras. Assim elas fazem mais sentido, aqui fora diante dos meus olhos e não atrás deles. Tenho direcionado a minha atenção aos meus sinais, tenho me dedicado a mim numa espécie de quarentena interior. E já consigo ver progresso. Estou no sexto livro do ano, lendo vorazmente já que não mais me preocupo tanto com tantas pessoas. Deixei de ser um zoológico aberto 24 horas, pessoas visitando o tempo inteiro, vigiando os meus chipanzés. Meus animais interiores agora andam calminhos, sós entre eles, ando retirando as jaulas aos poucos porque eles se desacostumaram a viver fora das suas respectivas grades. Ando lendo para o leão baixinho para acalmá-lo, livros cheios de esperança e humanidade para que aprendamos a viver sem as grades em harmonia. Não sou ingênua para achar que não vai dar briga, que eu vou conseguir convencer o leão a tornar-se vegetariano e para de comer os meus pedaços, não eu já passei dessa fase. Estou na verdade dedicada a explicar a ele as coisas e os animais que mais gosto do meu zoológico e peço com afeto que ao menos os meus prediletos sejam poupados, que ele só ataque para se alimentar e defender-se de perigos verdadeiros, que eu prometo que em troca vou tentar fazer o mesmo do meu lado de fora, atacar para me alimentar e defender-me de perigos verdadeiros. Vou mostrar-me segura, como eu sou por dentro, mostrar aos meus chipanzés que eu ainda jogo cocô nas pessoas vez em quando, que eu ainda sou curiosa como eles e posso sim mostrar-me esperta mesmo não sendo igual aos outros. Tenho que manter-me longe de tristezas avassaladoras que sempre me derrubam como tempestades de verão. Tenho que esquecer muito coisa aprendida depois de muito tempo em cativeiro, relembrar alguns instintos, escutar os meus animais do zoo e voltar a rir sozinha sem sentir falta de nenhum amigo de cativeiro que não conseguiu fugir comigo. Lembrar de não levar muito a sério as minhas penas da cabeça e correr por aí bagunçando-as. Também não me importar se tem alguém observando eu me lamber, eu lambendo a minha cria ou catando carrapato de algum amigo enquanto intercalo cafunés. Eu sou bicho-gente, tentando lembrar como é ser bicho-solto. E sabe do que mais, eu vou ali aproveitar o fim de tarde lendo pro meu leão.

sábado, março 10, 2012

O óculos. A tarde. Os companheiros.

Não olhei nos seus olhos no dia em que nos vimos da primeira vez, nem me detive no seu nariz tão evidente, no teu olhar sério ou na tua cara de CDF. Não, eu estava numa escola nova me sentindo o patinho feio, e quando eu não estou insegura acabo me escondendo na minha carranca, na minha audácia e na porra louquice. A gente não se olhou e foi amor a primeira vista não, ainda bem. Seu olhar para mim não dizia nada. Mas passaram se os anos e eu dividi meus textos com você, alguns segredos e finalmente a gente era amigo de se reconhecer um no olhar do outro. Mas não a gente não estava apaixonado, ainda bem. Você me ensinava física, química e matemática e eu não te ensinava nada. Lia como louca o que não era matéria da aula, discutia no corredor a conjuntura da educação no país, no estado, na nossa escola e atrapalhava a tua aula que por acaso era a minha também, porém eu cabulava quase sempre as aulas de exatas. Você me acompanhava ouvindo minhas ideias, compartilhando pensamentos e quando percebi você fazia parte do grêmio, do movimento político da escola e estávamos em sintonia, finalmente além de amigos tínhamos alguma coisa em comum para fazer, mas não a gente não estava apaixonado, ainda bem.
Tenho a sorte de saber o dia exato que você se apaixonou por mim, em um final de tarde na reunião que havíamos marcado para formar um grupo para passar o legado do que havíamos conquistado todos juntos no grêmio, já não estudávamos na mesma sala e nos conhecíamos há mais de dois anos, eu entrei usando óculos pela primeira vez na frente dos amigos, um óculos de grau de armação grossa e com formato engraçado, a minha cara. Sentei no birô e peguei meus apontamentos ia falar pra os novatos e incentiva-los a levar o projeto do grêmio adiante e um tempo depois você me contou que olhou para mim ali sentada, falando e balançou a cabeça como se estivesse zonzo sem acreditar que me via diferente. Seriam os óculos?? Acho que não, realmente ali eu já era outra mesmo, bem diferente da menina que você havia conhecido lá atrás, tantos namoros, tantas leituras, festas, amigos e lutas me transformaram, e sim meu querido amigo você naquele dia se apaixonou por mim a primeira vista, ainda bem. E eu? Bem, para variar eu estava noutra. E fiquei nesse outro por um tempo ainda, porque eu precisava e você sabia disso. Uns meses depois, você me contou tenso, ansioso que a amizade era diferente, que você havia se apaixonado e eu? Estava pronta para vê-lo diferente e passei a ver. Assim fácil. Acho que a gente foi construindo esse novo olhar. sabe há quanto tempo isso aconteceu? quase sete anos. Onde estamos hoje? no nosso apertamento um no quarto estudando e o outro no PC escrevendo. Casados, apaixonados, cúmplices, grandes amigos ainda, ainda bem.
Tanta água passou por esse rio. Foi tanta água e a gente já teve que dar boas braçadas juntos para não se separar, para virar adulto e não perder o freio. E aqui estamos juntos, muitos anos depois daquela tarde e dos meus óculos que nem existem mais. Não importa quanto tempo já passou, mas quanto ainda há de vir e é claro que a gente continue existindo e que ainda sejamos grandes companheiros.

quinta-feira, março 08, 2012

E se...?

Se tudo tivesse sido diferente, terminado diferente o que seria a gente? Um tal casal? Depois de tanta intimidade e cotidiano será que daríamos conta de nos aventurar a ser um tal casal começando do zero? Ou pior, de onde estávamos que já era bem longe e estragaria o contexto irremediavelmente, eu sei, porque te conheço. Crescemos juntos. Não consigo me imaginar vivendo esse tal casal caprichoso, nunca senti vontade de correr ao seu encontro, viver cena de filme contigo de casal apaixonadinho. Cansa. Colecionamos tantos por-do-sóis visto de dentro do mar, madrugadas de conversa, sonhos e sonos juntos, confidências de pé de ouvido, de olho no olho, dividimos medos, conquistas, amores, paixões, comida no mesmo prato, vodca do mesmo copo, cama de solteiro, cama de casal, cigarros, férias e datas especiais. Porque tudo isso não foi suficiente? Porque o que eu dava para mim era tudo que tinha e para você sempre foi pouco?
E se conseguíssemos entender a gente, liberar o super ego e falar sem omissões sobre nós, será que algo sobraria de lembrança? Ou será que finalmente colocaríamos essa história em seu lugar? Nunca saberemos. O que eu sei é que não troco sexo pelo que tivemos, não troco o que construímos (principalmente os bons momentos sem brigas e DRs) para formar esse tal casal. Porque seria uma mentira, porque não seria recíproco, porque depois de um tempo esse joguinho ficou para mim indigesto, chatinho e cansativo. Porque - e isso pode ser até cruel - eu te conheço demais para cair no seu papo de vida a dois, nunca esqueça quanto tempo faz que nos conhecemos, principalmente o dia que passamos a conversar com olhares e gestos. Era o que eu podia te oferecer de mais audacioso e honesto, mas não, não era o suficiente, você ficou preso no e se... por anos, confabulando o e se..., guardando seus planos para ele. Planos que não foram compartilhados comigo, logo nós dois que compartilhávamos a vida a tanto tempo.
Como eu fico sem o abraço de urso, sem o cacho enrolado no dedo e um filme no cinema? Como eu fico se eu não posso me obrigar, principalmente por que eu não quero, a viver do seu e se...? Sabe... eu quero um e se... diferente pra nós. Mais ou menos assim: e se você fosse franco, e se você esperasse menos, e se você tivesse sido compreensivo e respeitado meu querer, e se você não fosse possessivo e se não criasse a obrigatoriedade de ter sempre razão, e se não brigássemos tanto, e se esse contrato de amizade fosse melhor redigido, e se eu não conhecesse seus defeitos tão bem, e se você quisesse ser alguém melhor, e se a gente não tivesse tentando ficar junto há muito tempo atrás. E se eu precisasse tanto de você e nem você de mim, e se conseguíssemos construir algo mais saudável e até mais sólido. Porque teve uma época que foi pesado, cansativo e sem expectativa de melhoras, e um dia qualquer por volta das três da tarde você me desencantou, não fez nada grave não, foi sutil você nem percebeu, porém eu olhei pra você e pensei para que e por que a gente ainda tá nessa? E eu não tinha mais motivo para estar lá, só a certeza da saudade irracional que eu sentiria se tudo aquilo acabasse, mas sim meu querido eu tinha desistido de você, e você até pensa que foi sem tentar, porém saiba que teve uma época que eu tentei, que eu questionei a possibilidade do tal casal e você não me contagiou com seu projeto. Não me deu vontade de largar o status de amiga, porque só isso que você queria trocar o meu status, saliva e secreções e eu achei pouco o que você oferecia para trocar por tudo que eu dava e não aceitei, tudo foi bem rápido mas aconteceu e você nem notou que aquela era sua chance. Talvez ainda estava confabulando o e se...? Apanhei minhas bolinhas de gude e mesmo triste decidi não mais brincar com você, por mais que você fosse um pessoa que eu ame tanto sem nem saber direito de onde isso vem. E eu estou assim agora aposentada do nosso joguinho.