quarta-feira, janeiro 27, 2010

Prefiro não rotular

Eu tinha o que alguns chamam de amizade perfeita. Eu prefiro chamar de completude. Graças a uma força maior que desconheço, tenho algumas amizades perfeitas parecidas com essa que perdi, porém, nenhuma dessas me faz sentir menos a falta que ela me faz. Quais os motivos para o fim? A sociedade. Estranho né? Mas nesse caso foi. Essa mania besta que as pessoas tem de generalizar para achar o nome certo para as coisas, levou meu amigo embora. Quero deixar bem claro que eu nunca - principalmente agora depois que ele se foi - eu nunca tentei achar um nome para o que a gente tinha. Porque qualquer palavra já existente não caberia para o que tinhamos, nem se eu inventasse uma nova palavra para conceituar, ela ainda não diria tudo que essa amizade me disse com: troca de olhares, cumplicidade, amor (porque não dizer?), sinceridade e aquela magia que liga pessoas por aí - todos os dias que ela existiu. Eu tinha um amigo (um ex-namorado muito próximo e meio estranho como preferiram rotular) mas ele foi embora. Mudou-se da minha vida, da vida que a gente dividia quando estavamos juntos, para um outro lugar provavelmente sem o mesmo brilho que eu não sei onde é. Eu tinha um amigo cheio de defeitos; cheio de manias que me enlouqueciam, de cobranças sem lógica e ciúmes de irmão que me fez perder a cabeça e discutir feio várias vezes, mas nunca em nenhuma de nossas conversas acalorodas me fez esquecer o carinho sem pedidos, daquele abraço de urso, do ouvido que adorava minhas abobrinhas - e o mais incrível, que entendia todas elas - que só ele tinha. Das conversas da madrugada, dos passeios não programados de qualquer hora, das risadas e daquela cumplicidade que nem se comenta. Sim ele tinha defeitos que me enlouqueciam e me faziam gostar mais ainda deste "não-saber-porque-tanto-gostar-de-alguém-tão-irritante" que me deixava maravilhada em todos os dias. Mas esse meu amigo não quer mais dividir coisas comigo. Porque em algum momento que eu não sei bem precisar, eu ou ele, até os dois, ficamos meio assustados com a pressão do mundo com suas nomeclaturas e talvez tenhamos desistido. De quê? De defender o direito de amar e ainda sim não ter necessidade sexual alguma pelo outro. Como em o conto Os sobreviventes de Caio Fernando Abreu, nós tentamos algo mais a algum tempo atrás e não era bem isso que a gente precisava pra ficar junto. Faço-me clara? Nós só queriamos viver, compartilhando momentos algumas vezes, nos divertindo como amigas mulheres "não lésbicas" fazem. Ter o direito de não ouvir piadinhas, indiretas e até broncas mesmo de quem nem tem noção como amizade perfeita pode ser. Mas infelizmente nessa vida, essa minha alma-irmã tão querida e eu desistimos por puro cansaço de lutar contra essa tortura cultural desumana de rotular tudo e todos sempre. E olha que eu não fujo de briga.

quarta-feira, janeiro 13, 2010

Considerações sobre a liberdade

Sempre tive a sorte de ser livre, e só quem é livre sabe como a liberdade mete medo na gente. Ela nos transporta para um lugar tão instável, que as vezes por exemplo, num relacionamento a liberdade de ir e vir te faz pensar em só por um momento não querer ficar, e no instante seguinte te lembra que se for não há volta, que não é correto usar ao bel prazer o direito de ser livre e acabar destruindo o certeza dos outros.
Isso porque a liberdade acarreta ainda mais responsabilidade do que a "não liberdade", por um motivo lógico, quando não há direito de tomar decisões e só simplesmente acatá-las, não há a responsabilidade da decisão tomada. Não há o que pensar, o que antever, o que analisar, o que proteger, até porque a atitude tomada não dependia da pessoa que a tomou, porém, quando a atitude depende só de você para ser tomada e principalmente quando ela não muda o rumo só da sua vida, quando o direito de escolha e seu e ainda sim envolve a vida do outro, aí sim, a liberdade é posta a prova. A verdadeira liberdade, a liberdade de coexistir em harmonia, a de tomar decisões sábias e preocupadas com o rumo do que há de vir e com as pessoas envolvidas. E é sobre este tipo de liberdade que estou falando, e essa liberdade que agora eu tento entender, a tempos vejo essa liberdade sendo corrompida, usada com maus propósitos e contra as pessoas e não a favor.
Isso de ser livre que até parece coisa bem sutil nos dias de hoje, onde não existe repressão política e AI5, é uma coisa tão poderosa, tão definitiva e porque não dizer engajada se fosse usada da maneira certa.
Não é porque você tem o direito de tomar suas próprias decisões que você pode simplesmente ignorar o que é o melhor a se fazer para todas as pessoas que estão envolvidas nelas.
Não é porque você pode decidir em acatar ou burlar uma lei que você tem o direito de atingir o outro com essa decisão.
É por causa de pensamentos como esses que ainda hoje há acidentes terríveis por causa de motoristas alcoolizados, que cesáreas são marcadas sem levar em conta a mãe e nem o que é melhor pro bebê, que crianças não são amamentadas e que crianças cada vez mais novas são alfabetizadas sem maturação para isso. Isso acontece porque a responsabilidade com o outro não foi levada a sério, quando se toma uma decisão isso de "ser responsável pelo outro" vem em primeiro lugar.
Principalmente em dias como esses onde a liberdade já deveria ter sido internalizada com consciência.